sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Perdas em Vida

Caio Fernando Loureiro de Abreu escreveu certa vez que a dor de perder alguém em vida é pior do que a dor da morte, porque é o nunca mais de alguém que se poderia ter, já que está vivo e por perto.

Um dos grandes malefícios da minha doença, é que tenho como tendência natural - como vício absoluto - me legitimar e procurar segurança nos outros, nos amigos. E isso faz com que eu sofra muito e faz as pessoas que eu amo sofrer também.

O ser humano que precisa do outro pra se legitimar está fadado ao fracasso e ao sofrimento, porque  as circunstanciadas mudam, os gostos mudam, as prioridades mudam e por consequência as afinidades também.

Pessoas com borderline, como eu, colocam suas forças e esperança em outras pessoas com a crença de que nada irá mudar... E aquele seu parceiro, guerreiro de todas as horas sempre estará naquela condição de parceiro e guerreiro e fará - por questão de algum código moral interno - tudo pra preservar este pacto tão sagrado da amizade. Mas não, isso não vai acontecer, e não irá acontecer, porque isso não existe, isso não é amizade. Amizade não é isso.

Os únicos amigos, parceiros e companheiros de todas as horas que permaneceram "eternizados" foram os Friends, mas na vida real as coisas não ocorrem desta forma, simplesmente porque isso não existe.

Não que eu esteja dizendo aqui que eu não exista amizades verdadeiras, existem sim, e eu sei que tenho amigos leais e bons que me ajudam muito de várias formas, muitas vezes - 99,99% das vezes - sem entender o que realmente há de errado e como podem me ajudar, mas mesmo assim se esforçam ao máximo em me amparar.

Não tenho palavras pra descrever o quão grata sou por isso, eu sou mesmo, mas mesmo sabendo que minha doença que me faz ter conceitos deturpados e expectativas exacerbadas dos relacionamentos em geral - especialmente - nos relacionamentos com meus amigos, eu não posso deixar de sentir a dor da perda em vida.

A dor de perder aquela sensação de parceria indestrutível de adolescência com aquela amiga que você "cresceu" junto.

A dor de perder a preferência daquela amiga que além de amiga era a grande parceira de serviço que te concedia forças - além do normal - pra ir trabalhar em meio aos caos, e mesmo assim, tornar aquilo tudo muito divertido.

A dor de sentir que aquele amigo que você acha super bacana e em que você confia suas confidências, não te confidencia tantas coisas assim.

A dor de perder o posto da "Confidente Oficial" daquele amigo que você ama de paixão e te faz tão bem, mas que agora está apaixonado e se confidencia especialmente agora com um outro tipo de amiga... A amiga namorada.

Todas estas situações são normais e fazem parte do desenvolvimento da nossa vida, mas eu sofro muito com esta normalidade, eu sinto muita dor... A dor de perder aquela sensação de SER e TER "A amiga (o)".

Meu ser não tem a capacidade de aceitar esse desenvolvimento natural, aceitar que os amigos mudam, tem outros planos, outras prioridades e outras afinidades, e não é por isso que eles deixam de gostar de você ou que sua amizade se torna menos importante, simplesmente não é mais igual, porque é a ordem da natureza.  

Meu consciente sabe e repete vez após vez que meus amigos não estão me deixando de lado, que eles não estão me excluindo, que eles me amam e me veem como antes... Mas minhas emoções simplesmente se recusam firmemente a acreditar e me levam a devaneios, pensamentos, noias e conspirações tão absurdas como afirmar que James Dean não seria o homem ideal pra eu passar o resto da minha vida, rs.

Mesmo depois de horas e horas de luta árdua entre meu ser consciente e minhas emoções, no fim sempre estou exausta e com os mesmos sentimentos do Caio... "a dor de perder alguém em vida é pior do que a dor da morte, porque é o nunca mais de alguém que se poderia ter, já que está vivo e por perto."

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

País das Maravilhas - Wonderland

A saúde mental (sanidade mental) é descrita como
"um nível de qualidade de vida cognitiva e emocional ou a ausência de uma doença mental... a saúde mental pode incluir a capacidade de um indivíduo de apreciar a vida e procurar um equilíbrio entre as atividades e os esforços para atingir a resiliência psicológica".

Ao passo que a loucura ou insanidade é descrita como "condição da mente humana caracterizada por pensamentos considerados anormais pela sociedade."

O que seriam pensamentos considerados anormais pela sociedade? Acho que não existem respostas tabeladas a esta questão, deve ser por isso que a Organização Mundial de Saúde, afirma que não existe uma definição "oficial" de saúde mental.

Esse é um tema amplamente abordado e ao mesmo tempo amplamente camuflado. Vários, grandes nomes, da literatura, cinema, contos abordam tão intensamente e tão camufladamente este tema, que não da pra medir a satisfação do telespectador. Não dá pra saber se o fulano gostou, porque entendeu a mensagem, ou se ele gostou porque não entendeu - e o contrário também é verdadeiro - não sei se o indivíduo que não apreciou, não se atentou ao real significado da obra, ou se ele se atentou, e por este motivo não gostou.

Filmes como Alice no País das Maravilhas, Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge, Amnésia, O Grande Truque, Ilha do Medo, Cisne Negro, entre outros, que são campeões de bilheteria, trazem a tona histórias distintas, mas que tem a base em comum - os protagonistas destes trailers - tinham tudo e ao mesmo tempo não tinham nada, desejavam ardentemente se encontrar, e tinham uma obsessão tão intensa neste aspecto que os levava a um ponto de loucura, que ao mesmo tempo que era assustadora, era deslumbrante.

Analisando como exemplo o clássico Alice no País das Maravilhas, fica claro que a mensagem da história definitivamente não foi entendida na época de sua criação. Começando pelo fato que a história foi escrita por Lewis Carroll (Charles Lutwidge Dodgson), que era um matemático que escrevia livros somente questionando a lógica das coisas, conseguimos discernir que o objetivo dele não era criar um conto infantil.

Em 2010 o incrível Tim Burton, fez como que uma "continuação" da história, mas se valendo dos mesmos questionamentos, medos e dúvidas do conto original, acredito que ele tenha tentando trazer a real mensagem que Carroll tinha em mente, porém, não sei se seu objetivo foi alcançado.

Falando brevemente da Alice, a história claramente questiona os padrões sociais, os desafios, os questionamentos, a busca da identidade, a insatisfação com a realidade que a jovem - Alice - se depara.

Ao tentar fugir da realidade infeliz, Alice cai em um buraco que a leva ao Pais das Maravilhas - seu inconsciente - mundo em que nada é impossível.

No buraco que a Alice cai, vários objetos - sem sentindo - estão voando desordenadamente, alguns até mesmo de ponta cabeça. Isso mostra o quanto nosso inconsciente não apresenta lógica, ordem ou até mesmo racionalidade, o que pode nos impulsionar a ações incompreendidas.

Fora isso, todos os personagens que ela encontra no caminho tem significados bem específicos. O coelho com o relógio que está sempre com pressa, simboliza obviamente o Tempo. O tempo que é tão rígido e exigente e marca a quebra com a realidade e nosso mundo de "fantasias".

No País das Maravilhas, a Alice se depara com o caos, ela não consegue falar sobre ela mesma quando sua identidade é questionada pelos outros personagens, e chega até mesmo a ser vista como uma "impostora".

Fora todo este sofrimento, Alice precisa todo o tempo, decifrar enigmas e achar chaves para poder conseguir sair do País das Maravilhas - sair do inconsciente e voltar pro consciente -  pra tentar construir sua própria história.

Ao meu ver a Alice é uma jovem perdida dentro do seu inconsciente - tentando separar o que é real do imaginário - que está beirando a loucura e está lutando pela sua sanidade.